MARCELO KNOPFELMACHER, PRESIDENTE DO MDA: “ADVOGADO TEM O DEVER DE NÃO DELATAR O CLIENTE”

28/04/2013

O Movimento de Defesa da Advocacia, ou MDA,
surgiu em 2002, como forma de protesto e
instrumento de defesa dos advogados diante
das recorrentes invasões de escritórios pela
Polícia Federal. Passados mais de dez anos,
a instituição continua sua luta em defesa
das prerrogativas profissionais. As frentes
de batalha são várias: mais tempo para
sustenções orais, não restrição ao Habeas
Corpus, defesa dos conselheiros do Conselho
Administrativo de Recursos Fiscais (Carf),
honorários, processo eletrônico, posição da
advocacia nos tribunais em relação ao MP e
outras.

O MDA é relativamente pequeno se comparado
com a Ordem dos Advogados do Brasil, por
exemplo. São cerca de 400 membros e 66
conselheiros. Sua força, porém, está na
qualidade de seus quadros: presidentes e ex-
presidentes da OAB, de suas comissões e das
seccionais e de entidades como o Instituto
dos Advogados de São Paulo, a Associação dos
Advogados de São Paulo e o Centro de Estudos
das Sociedades dos Advogados.

Para o presidente do MDA, Marcelo
Knopfelmacher, mais conhecido como “Marcelo
K”, ao congregar numa única entidade os
representantes das diversas áreas de atuação
da advocacia, os problemas enfrentados pela
classe são compartilhados de maneira rápida
e combatidos de modo eficaz.

Uma das principais lutas da entidade é pela
inviolabilidade dos departamentos jurídicos
das empresas. “Não é porque o advogado é
interno que ele não é advogado. Ele também
está sujeito ao Estatuto da Advocacia, tem
os mesmos direitos, prerrogativas e
garantias”, diz.

Em entrevista à revista eletrônica Consultor
Jurídico, ele detalhou a atuação do MDA e
falou sobre questões como honorários, exame
de Ordem, lavagem de dinheiro e delação.
Sobre esse último tópico, é taxativo: “O
advogado tem o dever de não delatar o
cliente, sob pena de incorrer na prática de
crime previsto pelo artigo 154 do Código
Penal, que define a revelação sem justa
causa de segredo profissional”.

ConJur – Quando surgiu o MDA?
Marcelo Knopfelmacher – O MDA surgiu em
2002, de uma necessidade momentânea de
combater invasões aos escritórios de
advocacia. Depois vieram portarias do
Ministério da Justiça disciplinando a
questão, e a alteração da Lei da Advocacia
mencionando isso.

ConJur – Como ele está estruturado?
Marcelo Knopfelmacher – Temos quatro
comissões. Prerrogativas, que é a espinha
dorsal de toda a entidade representativa da
classe dos advogados; Direito Penal; Direito
Tributário; e Direito Empresarial. Presidem
essas comissões Rodrigo Jorge Moraes
(prerrogativas); Fabio Tofic Simantob
(Direito Penal); Walter Carlos Cardoso
Henrique (Direito Tributário), que é ex-
presidente da Comissão de Direito Tributário
da Ordem; e o Guilherme Setoguti (Direito
Empresarial).

ConJur – Vocês têm quantos associados?
Marcelo Knopfelmacher – Sessenta e seis
conselheiros, 400 associados
aproximadamente. Estão em alguns dos estados
da federação e temos representações nas
principais capitais: Rio de Janeiro,
Brasília e Porto Alegre. Muitas vezes, [o
MDA] funciona no próprio escritório do
representante, mas com representação formal
nessas localidades.

ConJur – Quando foram as eleições?
Marcelo Knopfelmacher – Dia 27 de fevereiro.
Fui reeleito presidente, o Romeu Amaral foi
eleito diretor adjunto, Humberto Gouveia foi
eleito diretor financeiro, Adriano Salles
Vanni, criminalista, o presidente do nosso
conselho, Rodrigo Rocha Monteiro de Castro,
societário, vice-presidente do conselho.
Criamos a figura do conselheiro honorário,
aquele que pelas suas próprias ações já fez
muito pela advocacia ou já fez muito pelo
MDA.

ConJur – Poderia citar alguns?
Marcelo Knopfelmacher – Antonio Cláudio
Mariz de Oliveira; Braz Martins Neto;
Arystóbulo de Oliveira Freitas; Márcio
Kayatt; Eduardo Salusse; Sérgio Rosenthal,
que foi primeiro presidente do MDA,
atualmente presidente da AASP; Roberto
Podval, que foi presidente do conselho do
MDA.

ConJur – Muitos ex-presidentes ou da OAB ou
da AASP.
Marcelo Knopfelmacher – Atualmente, temos o
privilégio de contar no nosso conselho com
os presidentes atuais da Aasp, Sérgio
Rosenthal; do Iasp, José Horácio Halfeld
Rezende Ribeiro; do Cesa, o Carlos Mateucci;
o ex-presidente da Ordem Antonio Cláudio
Mariz de Oliveira; e o ex-secretário geral
da Ordem, na gestão anterior, Braz Martins.
Mateucci também é tesoureiro da atual gestão
da Ordem.

ConJur – O que significa ter tantas
entidades reunidas no MDA?
Marcelo Knopfelmacher – O MDA é uma entidade
que congrega os demais presidentes,
portanto, tem uma representatividade muito
significativa. Isso faz com que os problemas
da advocacia sejam compartilhados de maneira
muito rápida e eficaz.

ConJur – Em quais frentes o MDA atua?
Marcelo Knopfelmacher – Estamos trabalhando
muito pelo Projeto de Lei que visa equiparar
os departamentos jurídicos das empresas aos
escritórios de advocacia do ponto de vista
da sua inviolabilidade. Não é só o espaço
físico que deve ser delimitado dentro das
empresas. A gente viu operações da Polícia
Federal nas empresas e não havia essa
separação do jurídico com as demais áreas.
Tivesse havido, não teriam tido o acesso
indiscriminado aos computadores dos
advogados que estão lá trabalhando. Da mesma
forma também não teriam acesso aos
computadores dos psiquiatras do RH, que têm
contato com informações sigilosas. Também
não teriam contato com a parte de assessoria
e de relações institucionais, em que o
jornalista deveria preservar o sigilo da sua
fonte. Por não haver uma delimitação de
espaço, houve abusos.

ConJur – Poderia detalhar mais a proposta?
Marcelo Knopfelmacher – O que se propõe é
que a mesma inviolabilidade que há para os
escritórios de advocacia seja estendida aos
departamentos jurídicos devidamente
delimitados e também as comunicações entre
os advogados internos e os seus
constituintes. Não é porque o advogado é
interno que ele não é advogado. Ele também
está sujeito ao Estatuto da Advocacia, tem
os mesmos direitos, prerrogativas e
garantias.

ConJur – O advogado de departamento jurídico
trata basicamente de Direito Empresarial ou
questões conexas. Não são questões
criminais. Por que a inviolabilidade desses
departamentos? São as questões comerciais
que estão em jogo?
Marcelo Knopfelmacher – Há questões de
segredo de mercado, portanto de natureza
concorrencial. Há também questões de
natureza fiscal que muitas vezes podem
resvalar em questões de natureza penal. Às
vezes essas questões de natureza fiscal
podem fragilizar o balanço das empresas com
a própria compreensão do valor da empresa.

ConJur – Mas isso não pode trazer um risco
de o departamento jurídico das empresas ser
utilizado como um biombo para práticas
ilícitas?
Marcelo Knopfelmacher – Precisamos fazer uma
separação muito clara entre a prática
profissional lícita da prática profissional
ilícita. Nós não queremos transformar o
departamento jurídico nem o escritório de
advocacia em um local no qual pode ser
escondido o produto do crime. O que se
propõe é que haja uma sensibilidade, um
cuidado para que naquela área delimitada os
mesmos direitos e garantias previstas para o
profissional que trabalha fora sejam
estendidos ao profissional que trabalha lá
dentro, que ele seja visto como profissional
e não como um executivo, apesar de muitas
vezes acumular as funções. Isso tem que ser
visto caso a caso, mas é muito importante
haver essa conceituação.

ConJur – O MDA também atua em questões
tributárias?
Marcelo Knopfelmacher – O MDA teve uma
destacada e muito bem noticiada atuação na
defesa intransigente dos conselheiros do
Carf. Fomos procurados por inúmeros
conselheiros que estavam se sentindo acuados
no exercício da sua judicatura
administrativa em função daquele
posicionamento inicial que a procuradoria da
Fazenda Nacional tinha adotado de perseguir
cegamente o crédito tributário, sem atentar
para a definitividade das decisões
proferidas em âmbito do Carf. Isso consta no
artigo 45 do decreto 70.235. As decisões do
Carf são definitivas em relação a União. Se
o particular se sente prejudicado pelas
decisões do Carf, ele pode procurar o
Judiciário, a União não.

ConJur – As ações populares incluíam o nome
pessoal dos conselheiros.
Marcelo Knopfelmacher – Alguns conselheiros
do Carf que também são conselheiros do MDA
estavam muito desconfortáveis com essa
situação. Não podemos transformar a
atividade judicante, tanto por parte dos
representantes do contribuinte como por
parte dos representantes do fisco, em uma
atividade de risco.

ConJur – O MDA tem alguma atuação no
Tribunal de Impostos e Taxas?
Marcelo Knopfelmacher – Temos no nosso
conselho alguns juízes do TIT, da Câmara
Superior, e estamos lutando para ampliar o
exíguo prazo de cinco minutos para produção
de sustentação oral no TIT São Paulo. Vamos
propor a alteração do decreto que trata
disso, a lei não estabelece o prazo.

ConJur – Como é essa norma?
Marcelo Knopfelmacher – √â um decreto. A lei
trata do processo administrativo tributário.
Ela confere o direito de produzir
sustentação oral, mas a regulamentação se
deu por decreto e ele fala em cinco minutos.
√â incompatível com o Estatuto da Ordem e com
os regimentos internos de todos os demais
tribunais judiciários e administrativos.

ConJur – Qual é o tempo dado nos tribunais?
Marcelo Knopfelmacher – Todos falam em 15
minutos. Fizemos um levantamento. O CNJ tem
um prazo de dez minutos para a sustentação
oral, mas estamos falando aqui do prazo
geral de 15 minutos, que é conferido pelos
tribunais de Justiça do país, pelos cinco
TRFs, pelo Supremo e pelo STJ.

ConJur – Por que a sustentação no TIT
precisa de mais que cinco minutos?
Marcelo Knopfelmacher – Cinco minutos é
muito pouco. Os autos de infração contemplam
vários itens acusatórios. Muitas vezes é
necessário compulsar provas, documentos. São
processos volumosíssimos. Não se consegue em
cinco minutos nem pedir para um filho
arrumar um quarto, que dirá defender os
direitos daquele que está sendo acusado e
cujo resultado daquela defesa pode inclusive
resvalar em um processo criminal.

ConJur – Vocês também atuam no Conselho
Municipal de Tributos?
Marcelo Knopfelmacher – O MDA está avaliando
a conveniência de fazer um ofício
respeitosamente ao Conselho Municipal de
Tributos, sugerindo que a marcação dos
julgamentos ocorra com maior antecedência.
Hoje são só dois dias.

ConJur – E qual seria o prazo adequado?
Marcelo Knopfelmacher – Um prazo de no
mínimo uma semana, dez dias corridos, seria
justo para que todos possam se organizar.

ConJur – Nesses órgãos administrativos, em
caso de empate, a decisão é pelo voto de
qualidade. Isso não os torna uma espécie de
ficção?
Marcelo Knopfelmacher – Absolutamente não.
Os três tribunais, Carf, TIT São Paulo e
Conselho Municipal de Tributos, são
tribunais em que efetivamente se produz
justiça fiscal. Não necessariamente os
representantes do Fisco acompanham as
posições dos autos de infração. Falo isso
por experiência própria, profissional e
também institucional.

ConJur – E em relação √†s punições?
Marcelo Knopfelmacher – No que diz respeito
à penalidade, se há empate, não pode ter o
voto de qualidade desempatando. Isso consta
no Código Tributário Nacional. Na dúvida,
sempre em favor do acusado. Mas não podemos
estender isso para o imposto, para a
contribuição ou para o tributo. No TIT, tem
os presidentes ímpares do fisco e as câmaras
pares do contribuinte. Pode ter um voto de
qualidade vindo de um representante do
contribuinte, por exemplo. As coisas têm
andado bem. Esses tribunais têm desempenhado
um trabalho importante.

ConJur – Em questões tributárias, é comum o
Executivo dizer ao ministro do Supremo que
aquela causa irá gerar um impacto bilionário
no Orçamento. O Fisco está ganhando a queda
de braço por causa desses elementos de
pressão sobre os julgadores?
Marcelo Knopfelmacher – Os elementos
numéricos e os argumentos econômicos sempre
foram considerados pelos julgadores de todos
os nossos tribunais. Às vezes o tamanho não
é exatamente aquele que está expresso nos
números, mas é importante ter a dimensão do
impacto da causa. Os argumentos econômicos
não só podem como devem influenciar um
julgamento. Aí entra a necessidade de ter
uma racional, razoável e efetiva modulação
dos efeitos dessas decisões. Não podemos
imaginar que a partir de uma decisão do
Supremo tenha-se a falência do governo
brasileiro. Há de se reconhecer que aquela
norma ou que aquela questão é
inconstitucional, que aquela cobrança é
inválida perante o ordenamento jurídico, mas
há de se reconhecer também um mecanismo
justo que permita fazer com que os
litigantes sejam ressarcidos pelo
recolhimento indevido.

ConJur – O Conselho de Controle da
Atividades Financeiras (Coaf) encerrou a
polêmica sobre a obrigatoriedade de informar
em casos de lavagem?
Marcelo Knopfelmacher – A resolução número
24 esclarece o que já consta da lei e diz o
seguinte: os órgãos reguladores próprios
tratarão do dever de informar. Para
situações em que não houver órgão regulador
próprio ou para situações em que o órgão
regulador próprio não se pronunciar ou não
regulamentar, o Coaf lhes fará as vezes. O
Conselho Federal da OAB, respondendo a uma
consulta provocada pela seccional de São
Paulo, normatizou a questão no sentido de
que os advogados não devem se sujeitar ao
cadastro, não devem promover o dever de
informar. Com estes arcabouços – nova lei de
lavagem, a regulamentação do Conselho
Federal e a própria resolução do Coaf
confirmando aquilo que já está na lei, a
questão está encerrada.

ConJur – Se o advogado souber que os valores
são ilícitos, quais são os procedimentos que
ele deve seguir?
Marcelo Knopfelmacher – Existe um princípio
chamado pecunia non olet, dinheiro não tem
cheiro. Se o Estado tributa o IPTU do
criminoso, se o criminoso paga a escola da
criança com dinheiro ilícito, se ele paga
assinatura do seu jornal de manhã com
produto do dinheiro ilícito, a sociedade não
pode se transformar em um órgão de
investigação de lavagem de dinheiro. Como é
que eu posso afirmar que aqueles valores que
o cliente está pagando ao advogado têm
origem ilícita? Isso é a consagração de um
Estado de terror, ninguém trabalha. A
questão dos honorários está de ligada à
incompreensão sobre a atividade. O médico
sabe que a pessoa tem problemas de saúde,
mas vai deixar de receber os seus honorários
por ter feito uma cirurgia no acusado de ser
o grande praticante de atividade ilícita? O
resort onde se hospeda o acusado da prática
da atividade ilícita está praticando lavagem
ao aceitar aquela reserva? Como é que ficam
essas questões?

ConJur – Mas a sociedade não tem obrigação
de coibir quando sabe da existência de
crimes de corrupção e de lavagem de lavagem
de dinheiro?
Marcelo Knopfelmacher – A sociedade tem o
dever de vigilância e o dever de informar
aos órgãos competentes que vão fazer essa
apuração. No caso da advocacia muitas
pessoas são tratadas em uma relação de
confiança. São segredos que o advogado vai
levar para o túmulo. O advogado não tem o
dever de delatar o cliente. Ele tem o dever
de não delatar o cliente, sob pena de
incorrer na prática de crime previsto pelo
artigo 154 do Código Penal, que define a
revelação sem justa causa de segredo
profissional. O jornalista em relação à sua
fonte também tem seus direitos assegurados.
Isso está previsto pela Constituição, uma
grande conquista de uma sociedade
democrática. O advogado funciona como porta
voz de alguém, assim como a imprensa. Nós
somos, como diz o doutor Antônio Cláudio
Mariz de Oliveira, “boqueiros”, nós falamos
em nome dos outros, nós não falamos em nome
próprio. Aquilo que nos é confiado em
segredo profissional deve ser mantido como
tal.

ConJur – Quais são as outras bandeiras do
MDA?
Marcelo Knopfelmacher – Nós tomamos a frente
na questão da pretensão de abolição do
Habeas Corpus substitutivo de Recurso
Ordinário. No dia 17 de setembro de 2012
oficiamos o então presidente do Supremo,
ministro Ayres Britto. Depois levamos cópia
do nosso ofício a todos os demais ministros,
manifestando a nossa grande preocupação em
decisões até então na 1¬™ Turma, no sentido
de abolir ou restringir o uso do Habeas
Corpus.

ConJur – E que avaliação o MDA faz dessa
questão do HC?
Marcelo Knopfelmacher – O Supremo volta a
admitir o uso do Habeas Corpus substitutivo,
que de certa forma foi um alento, mas a
gente continua vigilante. O Habeas Corpus
não é uma conquista da advocacia, mas da
cidadania. Qualquer pessoa pode impetrar um
Habeas Corpus, não precisa ser advogado. √â
um instrumento que nos resguarda, que nos
traz liberdade. Quem viveu a época da
ditadura, não é o nosso caso, nos conta que,
com a abolição do Habeas Corpus, nós
estávamos vivendo uma época de barbárie,
tempos sombrios que não queremos nem
rememorar.

ConJur -Há de fato então uma restrição ao
uso do Habeas Corpus?
Marcelo Knopfelmacher – Procurou-se criar
uma vedação ao uso do Habeas Corpus
substitutivo de Recurso Ordinário, mas a
jurisprudência do Supremo está sendo revista
para permitir novamente o uso do Habeas
Corpus substitutivo de recurso ordinário.

ConJur – Como vocês veêm a discussão quanto
à posição que os advogados ocupam nos
tribunais em relação ao MP?
Marcelo Knopfelmacher – Fomos admitidos como
amicus curiae na reclamação proposta por um
juiz federal de São Paulo, em que questiona
com toda razão o assento do Ministério
Público nas audiências criminais. Nas causas
de natureza criminal ou nas causas em que o
Ministério Público figura como parte e não
como custos legis, não portanto como fiscal
da lei, o Ministério Público deve ocupar o
mesmo patamar físico que os advogados. A
expressão parquet significa tablado em
francês. Na França os membros da Promotoria
sempre falavam a partir de um tablado, que
era abaixo da bancada dos juízes, mas isso
já os diferenciava.

ConJur – Por que essa questão é importante?
Marcelo Knopfelmacher – √â fundamental que se
tenha uma verdadeira paridade de armas.
Quando uma testemunha entra em uma audiência
e verifica a figura do juiz ao lado do
promotor, sentados na mesma bancada,
automaticamente se sente muito intimidada
quando perguntada por essa autoridade. Pode
influenciar um julgamento.

ConJur – A ideia dessa reclamação é colocar
o promotor na tribuna junto com o advogado
ou de dar assento para o advogado ao lado do
juiz?
Marcelo Knopfelmacher – Tem algumas
propostas: ou se fazer um “U”, ou se fazer
um “T”. No “T” o magistrado estaria em cima,
e o advogado e o promotor frente a frente.

ConJur – Como funciona nos tribunais dos
Estados Unidos?
Marcelo Knopfelmacher – Sim. No “U” há
também o magistrado no centro, e o advogado
e o promotor também frente a frente, no
mesmo nível. A advocacia não pode estar
simbolicamente em um patamar menor ou menos
significativo do que o órgão acusador. Isso
é injusto.

ConJur – Quem mais está como interessado?
Marcelo Knopfelmacher – A Associação
Nacional dos Defensores Públicos Federais, a
Defensoria Pública da União, o Conselho
Federal da Ordem. Além disso, também estamos
atuando na questão da tramitação direta dos
inquéritos entra a Polícia Federal e o
Ministério Público.

ConJur – Por que essa questão é importante?
Marcelo Knopfelmacher – A Resolução 63 [do
Conselho de Justiça Federal], a pretexto de
tornar mais célere o inquérito, acaba por
banalizar os prazos para a conclusão dos
inquéritos policiais. Na Justiça Estadual,
são dez dias para acusados presos, 30 dias
para soltos. Na Federal, 15 dias
prorrogáveis por igual período, o que
acarreta grave violação dos direitos e
garantias do investigado, das prerrogativas
dos advogados, da polícia judiciária e o
próprio Poder Judiciário, que se pretende
agora que permaneça alheio ao controle e
trâmite dos inquéritos policiais, sendo
chamado a manifestar-se somente em casos
excepcionais.

ConJur – Alguns juízes continuam se negando
a receber advogados, apesar da determinação
do Estatuto da OAB. Já outros, como o
ministro Joaquim Barbosa, por exemplo, dizem
só receber se a outra parte também esteja.
Como o senhor vê essas restrições?
Marcelo Knopfelmacher – Isso ainda
lamentavelmente acontece, inclusive no
estado de São Paulo. Temos recebido
reclamações na nossa Comissão de
Prerrogativas. Existe muita incompreensão e
intolerância com a atividade do advogado. O
advogado é visto como um mal necessário, e
isso é ruim. Quanto a atender o advogado
junto com a outra parte, não vejo grandes
problemas, desde que isso não impeça o
próprio exercício profissional. Se a
situação for de urgência, deve estar
dispensada a presença da contraparte, mas se
não houver essa necessidade e puder ter um
agendamento, não vejo isso como uma
restrição indevida. Acho até salutar.

ConJur – Vocês brigaram muito por causa do
horário de atendimento no fórum central aqui
no TJ de São Paulo. Essa história acabou?
Marcelo Knopfelmacher – Essa história não
acabou, e está sendo encampada mais
diretamente pela Ordem de São Paulo, pela
Aasp e pelo Iasp. Nós deliberamos por
aguardar. Estamos nos sentido representados
pelas demais entidades nessa questão.

ConJur – Qual sua opinião sobre isso?
Marcelo Knopfelmacher – Se há um funcionário
dentro das repartições públicas, um
servidor, nos termos do artigo 7º, inciso
VI, alínea “c” do Estatuto da Advocacia, é
garantido ao advogado ingressar livremente
em qualquer edifício ou recinto em que
funcione repartição judicial ou outro
serviço público onde o advogado deva
praticar ato ou colher prova, ou informação
útil ao exercício da atividade profissional.
Se há funcionários trabalhando,
necessariamente o advogado tem que ser
atendido.

ConJur – Temos um CPC que fala de uma margem
de 10% a 20% do valor da condenação como
honorário para advogado, mas esse limite não
é respeitado. Em que uma nova proposta para
o CPC pode resolver esse problema?
Marcelo Knopfelmacher – Está-se querendo
consagrar o desrespeito. As pessoas têm
muito preconceito em relação a essa questão
de honorários. Os honorários representam a
remuneração do profissional. Se ele
contribuiu para o resultado, é justo que o
juiz arbitre entre 10% e 20% do valor da
condenação. O que se vê, lamentavelmente, é
que em causas de altíssima complexidade, em
que o profissional teve de levar o caso até
as mais altas instâncias, os honorários são
fixados em valores irrisórios. Uma causa de
R$ 10 milhões, ou de R$ 5 milhões pode
ensejar honorários de R$ 2 mil. √â uma
questão de proporcionalidade. Estamos
atuando no Congresso Nacional para fazer
valer a aplicação da verba honorária mínima.
Isso é uma questão de dignidade.

ConJur – Mesmo em questões tributárias em
que a Fazenda Pública sofreria um impacto
bilionário?
Marcelo Knopfelmacher – Os casos que geram
impacto bilionário normalmente são causas
cujo valor da causa é baixo. Mil reais. Dois
mil reais. Tem que ter uma regra geral, e
ela deve ser cumprida. Se tiver uma exceção,
vamos tratá-la como tal.

ConJur – Nos últimos anos, houve um boom nos
cursos superiores, especialmente nos de
Direito. Isso refletiu na qualidade da
formação?
Marcelo Knopfelmacher – Essa questão nos
remete, necessariamente, à questão do exame
de Ordem. A advocacia é uma das carreiras
que ainda tem esse exame, e ainda bem que o
tem, porque funciona como um filtro. Em
todas as demais carreiras jurídicas é
necessário fazer um exame, um concurso
público rigoroso com tantas provas, com
tantos certames, com tantas exigências, e
para advogar se discute tanto sobre a
necessidade do exame de Ordem. A advocacia é
uma carreira jurídica tão importante quanto
às demais. Quem defende o fim do exame de
Ordem deveria defender também o fim dos
concursos públicos.

ConJur – O exame de Ordem é equivalente a um
concurso público?
Marcelo Knopfelmacher – Ele faz as vezes.
Talvez não seja tão rigoroso quanto um
concurso público, mas deveria ser o mais
rigoroso possível dentro de uma intenção de
trazer as pessoas para a profissão, e não de
afastar. Temos que trazer as pessoas que têm
preparo.

ConJur – A proposta do novo CPC diminui a
possibilidade de recursos. O advogado e o
excesso de recursos são realmente os
culpados pela morosidade?
Marcelo Knopfelmacher – Não há
multiplicidade de recursos. Pode haver um
mau uso, e existe uma carência tanto de
recursos como de infraestrutura como de
pessoal no Poder Judiciário. “Justiça tardia
não é Justiça, senão injustiça qualificada”,
já dizia Rui Barbosa. Justiça rápida demais
é irresponsabilidade. Tem que ter um meio
termo. Se realmente configurada a prática de
reiteração desnecessária, isso pode ser
combatido com imposição de multas e sanções
processuais. Muitas vezes, o Judiciário,
amparado em uma interpretação de que tal
matéria já foi objeto de Recurso Repetitivo
ou de alguma decisão final das cortes
superiores, acaba em uma interpretação
equivocada decidindo outros casos sob o
manto daquilo que já está decidido, quando
na verdade é uma causa nova.

ConJur – Os institutos da Repercussão Geral
e dos Recursos Repetitivos são bem aplicados
pelos tribunais?
Marcelo Knopfelmacher – Há casos em que
acontece má aplicação, e há casos em que
realmente é necessário ter a aplicação
desses filtros, porque o volume é muito
grande. Mas os erros são muito difíceis de
serem reparados. Tudo cai sob o manto do
assunto, quando o mesmo assunto pode ser
encaminhado por diversos pontos de vista.

ConJur – Acabaram-se as grandes teses
tributárias?
Marcelo Knopfelmacher – Tese é uma
discussão, debate, e debate nunca vai
acabar. Mas as teses massificadas
praticamente acabaram. Hoje prevalecem as
questões pontuais.