Advogados cujo comportamento e linguajar contra as partes em audiências e processos são considerados “excessivos” têm sido condenados a pagar danos morais. Ainda que o Estatuto da Advocacia dê a liberdade à atuação desses profissionais, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) em pelo menos cinco casos condenou os advogados por afronta à honra dos envolvidos nas ações – sejam partes ou mesmo magistrados. A Corte, nos processos julgados, entendeu que a imunidade profissional não é absoluta.
Por ter dito, por exemplo, em um processo que um cliente do Banco do Brasil estava “mais perdido que cachorro de pobre em dia de mudança”, o STJ condenou o advogado do caso a pagar dez salários mínimos (R$ 5.200) ao consumidor. O detalhe é que o banco foi excluído da condenação pelo STJ, ao contrário do entendimento do Tribunal de Justiça do Maranhão – que havia condenado a instituição ao pagamento. Para os ministros – entendimento aplicado a todos os casos -, as empresas não poderiam ser condenadas, pois não permitiram em nenhum momento que os advogados utilizassem expressões caluniosas ou agressivas. O Banco do Brasil informou que concorda com a tese do STJ, tanto que “advogou” nesse sentido.
O Banco do Estado do Espírito Santo (Banestes) também se livrou de uma indenização que acabou por recair sobre o advogado que o representava no processo. O profissional acusou a parte contrária, um juiz, de agir com autoridade. O magistrado propôs uma ação contra o Banestes para discutir uma agressão que teria sofrido de um segurança da agência. Pelo excesso do advogado na defesa do banco, recebeu o equivalente a dez vezes o valor de seus vencimentos. O Banestes não quis comentar o assunto.
A imunidade profissional do advogado é garantida pelo Estatuto da Advocacia, uma lei de 1994. Segundo a norma, não constitui “injúria ou difamação puníveis qualquer manifestação que parte do advogado, no exercício de sua atividade, em juízo ou fora dele”. No entanto, os excessos cometidos podem ser punidos com sanções disciplinares pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), de acordo com o Estatuto. Porém, o STJ entende que há limites para a aplicação da norma.
O presidente do Tribunal de Ética da OAB de São Paulo, Carlos Roberto Mateucci, diz que o advogado precisa da imunidade profissional para atuar com autonomia e liberdade. “Porém, não quer dizer que ofensas desproporcionais, não vinculadas ao tema do processo, não possam ser punidas tanto no Tribunal de Ética quanto por uma eventual ação de danos morais “, afirma. O diretor presidente do Movimento de Defesa da Advocacia (MDA) Marcelo Knopfelmacher, também concorda com essa posição. Para ele, o advogado não pode fazer ofensas pessoais ao juiz ou à parte contrária nas contestações. No entanto, Knopfelmacher entende que a empresa contratante dos serviços jurídicos pode indenizar conjuntamente, caso tenha conhecimento da peça processual que causou a ofensa antes de ser incluída no processo.
Além das ofensas √†s partes, os juízes titulares dos processos que se sentem lesados também têm pedido indenizações contra advogados. Em um desses casos, por exemplo, um juiz federal do trabalho, no Rio Grande do Norte, foi acusado de ter presidido “audiência por debaixo do pano”, permitido a “instalação de banca de advocacia em sala de audiência” , e, por fim, de “forjar sentença”. Por isso, foi condenado a R$ 50 mil de indenização no STJ.
Outro advogado que defendia um político na Justiça Eleitoral, em um processo por propaganda irregular, também foi condenado a pagar essa mesma quantia, por decisão da Corte. O advogado acusou o juiz, no recurso, de ser “aplicador de dois pesos e duas medidas” ao beneficiar os partidos de esquerda nas suas ações, ser “membro de juizado ou tribunais de exceção”, ser juiz que não teria dignidade sequer para renunciar à magistratura.